• Chamada para dossiê: “Periferia é Periferia em qualquer lugar”: produção cultural em periferias urbanas

    Published October 2, 2024

    Editoras de organização

    Adriana Facina
    Programa de Pós-graduação em Antropologia Social, Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro

    Silvia Capanema
    Université Sorbonne Paris Nord, pesquisadora de Pléaide/Campus Condorcet, pesquisadora bolsista CNRS CREDA-IHEAL (2024-2025)

    Sobre a língua de publicação e número de artigos previstos:

    Serão aceitos trabalhos em francês, espanhol ou inglês.

    Datas importantes:

    Atribuição e Finalização dos pareceres:
    Junho – Setembro/2025
    Ajustes e entrega das versões finais dos artigos:
    Outubro – Novembro/2025
    Entrega dos textos:
    Dezembro/2025
    Editoração
    Janeiro e Fevereiro/2026
    Publicação do dossiê:
    Março/2026

    Chamada para artigos
    “Periferia é Periferia em qualquer lugar”: produção cultural nas periferias urbanas

    O verso que dá título a este dossiê foi retirado da canção “Brasília Periferia”, composta por Gog, rapper pioneiro e referência para o movimento hip hop no Brasil, e lançada em 1994 no álbum Dia a Dia da Periferia. Esta frase virou um ditado comum nas periferias brasileiras, sobretudo depois de sua citação pelos Racionais MC’s, na canção “Periferia é Periferia”, que consta do álbum Sobrevivendo no Inferno, de 1997. Para nós, essa frase aponta não para uma uniformização das diferenças, no sentido de que periferia é tudo igual. Mas sim na direção da identificação de um fenômeno global, fruto da dinâmica do modo de produção capitalista, que cria periferias mesmo no centro do capitalismo, que se reproduz a partir da superexploração e da precarização da classe trabalhadora no mundo. Existe uma experiência comum na conformação de sujeitos periféricos (D’Andrea, 2022).

    Pesquisar periferias urbanas não é seguir algum tipo de desejo colonialista pelo exótico, pela coleção de práticas estranhas e surpreendentes produzidas pelo Outro. As periferias urbanas são o centro do desenvolvimento capitalista hoje, onde se concentram as distopias e também as utopias contemporâneas. Compreender o mundo contemporâneo, suas contradições, perigos e possibilidades de futuro exige a observação atenta do que se passa nas periferias urbanas, em particular (mas não somente) as do sul do mundo.

    O filósofo Paulo Arantes (2023) defende que está em curso uma brasilianização do mundo, uma ironia que inverte o sentido positivo do mito que afirma ser o Brasil o país do futuro. A obscena desigualdade social brasileira, o enclausuramento das classes superiores em guetos de elite, a banalização do extermínio dos mais pobres, sobretudo negros e indígenas, a falta de acesso a direitos básicos, a precarização dos direitos sociais e trabalhistas, o desmonte das instituições públicas de assistência social, a financeirização brutal da economia, a associação entre cidadania e consumo, a favelização das cidades, a predominância do trabalho informal, o controle social violento e militarizado, o racismo e a xenofobia que estigmatizam as populações dos bairros populares em diferentes lugares do mundo, o banditismo ultraindividualista, o crescimento das igrejas-empresas capazes de disseminar o espírito do neoliberalismo e um conservadorismo violento que se volta contra minorias e assume a forma de uma guerra santa do Bem contra o Mal são algumas das características que avançam das periferias para o centro do capitalismo global. O mal-estar na cidade é reflexo de uma desagregação social que decorre do estágio atual do modo de produção capitalista.

    Seguindo a mesma linha de argumentação, o geógrafo Thiago Canettieri (2020) afirma que com a decomposição da sociedade do trabalho surgiu uma nova configuração social baseada na forma-periferia. Uma condição marcada pela violência, pela precariedade, sujeita aos intensos regimes de exploração e à subsunção total da vida, integrada pela exclusão, traços distintivos de formas sociais que sempre estiveram presentes nas periferias dos países periféricos. Com o desenrolar da crise do capital e do colapso da modernização, podemos ver figurar o devir-periferia do mundo. A forma-periferia é, portanto, a forma pela qual se gerencia uma sociedade em derrocada. A universalização da forma-periferia é o devir-periferia do mundo.

    A dominação social pela precarização impacta a formação de subjetividades, desestimulando solidariedades de classe, alimentando medos e ressentimentos sociais difusos, disponíveis para captura por discursos de ódio, teorias conspiratórias e negacionismos científicos. Por outro lado, as formas de gentrificação dos territórios periféricos surgem, de maneira ambígua, como uma única reposta do capitalismo neoliberal, mas também como uma ameaça de expulsão e perda de referências para as populações já enraizadas num território perriférico, principalmente as mais empobrecidades e discriminadas.

    Essas reflexões são fundamentais para compreendermos o momento histórico em que vivemos. Falta a elas, entretanto, o que Didi-Huberman (2011) denominou sobrevivência dos vaga-lumes. Nesse cenário pré-apocalíptico, onde estão as pequenas luzes, os lampejos que permitem entrever saídas, imaginar futuros alternativos que animem a luta social e combatam o conformismo que resulta do pessimismo absoluto?

    Pesquisar a arte e a cultura produzidas nas periferias urbanas é uma maneira de procurar esses vaga-lumes, essas frágeis luzes que iluminam sutilmente a noite, capazes de mostrar que as contradições do modo de produção capitalista sempre deixam brechas para sua substituição por um modo de vida mais justo e feliz. Como diz Fredric Jameson (2021), é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo. A imaginação utópica está em baixa em nossos tempos.

    O sonho de viver do trabalho com arte e cultura é presente nas periferias urbanas.  No Brasil, esse trabalho sonhado dificilmente se torna meio de vida para a classe trabalhadora e se opõe às ocupações precárias disponíveis para essa classe, sempre com seu tempo de vida roubado pela superexploração e pela fragilidade dos direitos trabalhistas. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 38,7% da classe trabalhadora brasileira está em empregos informais, o que quer dizer sem qualquer proteção de direitos trabalhistas. Entre pessoas negras, essa porcentagem ultrapassa os 40%. O número de trabalhadores informais (38,9 milhões) é maior que o de formais (38 milhões). Nos países do Norte global, ainda que a relação entre trabalho formal e informal não seja a mesma, as periferias também concentram maior índice de desemprego e pobreza, e alguns bairros populares são territórios de importante presença da migração pós-colonial, ao ponto de inaugurar o debate sobre a questão unicamente vista como “social” para a questão também “racial” na Europa (Fassin & Fassin, 2006). Nesse sentido também, as periferiais dos países centrais do capitalismo também se aproximam das periferias dos países periféricos, onde pobreza e discriminação racial coabitam (Fernandes, 2021; Nascimento, 2021).

    O trabalho sonhado, viver do trabalho criativo com arte e cultura, é uma utopia realizável e índice do mal-estar da classe trabalhadora tanto com o mundo do trabalho do capitalismo contemporâneo quanto com a psicopolítica neoliberal baseada no desempenho, na competitividade, no individualismo e no consumismo (Han,2020).

    Neste dossiê pretendemos reunir artigos que analisem as periferias urbanas a partir de sua produção artística e cultural. Como periferia não é apenas um espaço geográfico, mas é sobretudo um lugar simbólico, entendemos essa produção cultural de modo amplo, tendo as periferias urbanas como referência criativa. Isso inclui o funk, o hip hop, o grafite, o carnaval, e ainda o teatro, a dança, o rock, as artes visuais e audiovisuais, a literatura, os festejos populares etc.

    Ainda nessa compreensão da periferia como lugar simbólico, não limitamos a nossa abordagem à produção cultural das favelas e bairros populares. Os quilombos urbanos, os indígenas vivendo na cidade, os hospitais psiquiátricos, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), as escolas e universidades públicas, os presídios e centros de socioeducação são lugares em que a arte e a cultura estão presentes, como táticas de sobrevivência e como estratégias de esperança. Buscamos entender as confluências possíveis entre diferentes condições periféricas (SANTOS, 2023).

    Essa periferia símbolo de uma experiência compartilhada pela classe trabalhadora urbana cria uma linguagem que em parte é universal. Essa linguagem é criada e se manifesta nas múltiplas criatividades presentes nesses territórios. Um desses comuns é o fato de que esses artistas vêm a cultura como trabalho, como modo de garantir sustento, a produção e reprodução material da vida. Em tempos de precarização generalizada do mundo do trabalho, o sonho de viver do trabalho com arte e cultura se torna ainda mais forte. A precarização amplia o sofrimento, físico e mental, dos trabalhadores. Mas ela também aproxima as condições de remuneração e emprego ordinárias da incerteza típica do trabalho artístico. Se até os anos 1990, o dilema do artista popular era escolher entre o emprego de carteira assinada e a falta de garantias do trabalho com a arte, nos dias de hoje as alternativas ao trabalho artístico não fornecem mais segurança. Essa situação vem sendo estudada no Brasil (Facina et al., 2019), mas nos interessa criar pontes e paralelos com outras periferias do mundo, que compartimham valores e reconhecimentos comuns através da globalização econômica e cultural, mas também admitem particularidades locais, seja na América Latina, na América do Norte, na Europa, na Ásia ou na África.

    Fato é que se pode observar, como pesquisadores ou leigos interessados, que há uma imensa e fervilhante criatividade nas periferias urbanas mundiais. Não é possível pensar as cidades, no centro e na periferia do capitalismo, sem analisarmos essa efervescência, como formas da “culturas de baixo” que se impõem nas culturas dominantes ou hegemônicas (Capanema et al., 2020 ; Liguori et al., 2022). Ela traz dicas preciosas de possibilidades utópicas, de inéditos viáveis, como dizia Paulo Freire (2011), que nos permitam confrontar o apocalipse e adiar o fim do mundo (Krenak, 2019), bem como refletir sobre os dilemas e impasses do mundo atual e que está por vir (crise climática, crise da informação, negacionismo, novas formas de fascismo, fratura social) (Fassin, 2022). Os estudos sobre as dinâmicas criativas nas periferias – espaços de resistência, sobrevivência e constante inovação –  podem fundamentar e fortalecer políticas públicas que dialoguem com essa produção.

    Buscamos neste dossiê reunir trabalhos que contribuam para a ampliação de horizontes reflexivos na problematização teórico-metodológica sobre a produção cultural nas periferias urbanas, com base em dados empíricos de pesquisas de campo ou em arquivos. Procuramos compilar artigos, balanços bibliográficos ou ensaios audiovisuais que tratem de experiências etnográficas de trabalho de campo, problematizem questões de método ou remetam a inovações teóricas que lidem com a complexidade do tema.

    Para as regras gerais de submissão e tradução de artigos, ver: https://www.scielo.br/journal/vb/about/#instructions.

    Appel à contributions
    « La périphérie est la périphérie n’importe où »: la production culturelle dans les périphéries urbaines

    Les vers ci-dessus choisis comme titre de notre dossier sont extraits de la chanson “Brasília Periferia”, une composition de l’album Dia a Dia da Periferia de 1994 de Gog, rapper pionnier et considéré comme une ou la référence du mouvement hip hop au Brésil. Cette phrase est devenue un véritable “lieu commun” dans les périphéries urbaines au Brésil, notamment après reprise, par le groupe de rap Racionais MC’s, dans la chanson “Periferia é Periferia” de l’album Sobrevivendo no Inferno, sorti en 1997. Pour nous, cette phrase est loin d’incarner une uniformisation des différences qui signifirait que toutes les périphéries seraient identiques. Au contraire, elle indique plutôt l’identification d’un phénomène global, fruit de la dynamique des modes de production capitaliste. Ces formes de production créent des périphéries partout, y compris au coeur du capitalisme qui se reproduit avec la surexploitation et la précarisation des classes laborieuses dans le monde. Nous pouvons dire qu’il existe une expérience commune dans la construction des sujets périphériques (D’Andrea, 2022).

    Faire de la recherche sur les périphéries urbaines n’équivaut pas à suivre un désir colonialiste pour l’exotique, pour l’ensemble des pratiques étranges et surprenantes produites par l’Autre. Les périphéries urbaines sont le centre du développement capitaliste aujourd’hui, là où se concentrent les dystopies mais aussi les utopies contemporaines. Comprendre le monde contemporain, ses contradictions, ses dangers et ses possibilités d’avenir exige une observation attentive de ce qui se passe dans les périphéries urbaines, en particulier (mais pas seulement) celles du Sud global.

    Le philosophe Paulo Arantes (2023) soutient qu’une “brésiliennisation” du monde est en cours, une figure de langage (ironique) qui inverse le sens positif du mythe selon lequel le Brésil serait le pays du futur. L’obscène inégalité sociale brésilienne, l’enfermement des classes supérieures dans des ghettos d’élite, la banalisation de l’extermination des plus pauvres, en particulier des Noirs et des autochtones, le manque d’accès aux droits fondamentaux, la précarité des droits sociaux et du travail, le démantèlement des institutions publiques d’assistance sociale, la financiarisation brutale de l’économie, l’association entre citoyenneté et consommation,  les bidonvilles, la prédominance du travail informel, le contrôle social violent et militarisé, le racisme et la xénophobie qui stigmatisent les populations des quartiers populaires dans différentes parties du monde, le banditisme ultra-individualiste, la croissance d’églises corporatives capables de diffuser l’esprit du néolibéralisme et un conservatisme violent qui se retourne contre les minorités et prend la forme d’une guerre sainte entre le Bien et le Mal… Voici quelques perspectives qui avancent des périphéries vers les centres du capitalisme global. Le mal-être dans la ville est le reflet d’une désagrégation sociale qui est le résultat du stade actuel du mode de production capitaliste.

    Dans le même ordre d’idées, le géographe Thiago Canettieri (2020) affirme qu’avec la décomposition de la société du travail, une nouvelle configuration sociale basée sur la forme périphérie émerge. Une condition marquée par la violence, la précarité, soumise à d’intenses régimes d’exploitation et à la subsomption  totale de la vie. Cette composition sociale est marquée par l’exclusion qui a toujours été présente dans les périphéries des pays périphériques. Avec l’accentuation de la crise du capital et l’effondrement de la modernisation, nous pouvons constater q’un “devenir périphérie” du monde est en train de se configurer. Cette forme périphérique est donc la manière dont une société en effondrement se constitue. Cette universalisation de la “forme périphérie” est le “devenir périphérie” du monde.

    La domination sociale par la précarité impacte la formation des subjectivités, décourageant les solidarités de classe, nourrissant les peurs et diffusant les ressentiments sociaux. Ces nouvelles formes sont plus vulnérables pour être capturées par les discours de haine, les théories du complot et le négationnisme scientifique. D’autre part, les formes de gentrification des territoires périphériques émergent, de manière ambiguë, comme une réponse unique au capitalisme néolibéral, mais aussi comme une menace d’expulsion et de perte de repères pour les populations déjà enracinées dans un territoire périphérique, en particulier les plus pauvres et les personnes ciblées par les discriminations.

    Ces réflexions sont fondamentales pour nous permettre de comprendre le moment historique dans lequel nous vivons. Il leur manque cependant ce que Didi-Huberman (2011) a appelé “la survie des lucioles”. Dans ce scénario pré-apocalyptique, où sont les petites lumières, les éclairs qui permettent d’entrevoir des issues, d’imaginer des futurs alternatifs qui animent la lutte sociale et combattent le conformisme résultant du pessimisme absolu ?

    Etudier l’art et la culture produits dans les périphéries urbaines est une manière de chercher ces lucioles, ces lumières fragiles qui éclairent subtilement la nuit, capables de montrer que les contradictions du mode de production capitaliste laissent toujours des vides pour le remplacement de ce système écrasant par un mode de vie plus juste et plus heureux. Comme le dit Fredric Jameson (2021), il est plus facile d’imaginer la fin du monde que la fin du capitalisme. Aujourd’hui, l’imagination utopique est à son plus bas niveau.

    Le rêve de vivre de l’art et de la culture est présent dans les périphéries urbaines.  Au Brésil, ce “métier rêvé” devient parfois un moyen de vie pour la classe ouvrière et s’oppose aux emplois précaires qui s’offrent à cette classe, toujours avec leur temps de vie volé par la surexploitation et la fragilité des droits du travail. Selon l’Institut brésilien de géographie et de statistique (IBGE), 38,7 % de la classe ouvrière brésilienne occupe des emplois informels, c’est-à-dire,  sans aucune protection du droit du travail. En ce qui concerne la population noire ou afro-descendante, ce pourcentage dépasse 40 %. Le nombre de travailleurs informels (38,9 millions) est supérieur à celui des travailleurs formels (38 millions). Dans les pays du Nord global, bien que la relation entre le travail formel et informel ne soit pas la même, les périphéries concentrent également des taux de chômage et de pauvreté plus élevés, et certains quartiers populaires sont des territoires d’ avec une importante présence de migrations postcoloniales. Dans ces conditions, on voit émerger un nouveau débat, on passe progressivement de la question exclusivement « sociale » à la question également « raciale » en Europe (Fassin & Fassin,  2006). En ce sens aussi, les périphéries des puissances centrales du capitalisme sont également proches des banlieues des pays périphériques, où coexistent la pauvreté et la discrimination raciale depuis plusieurs décennies, voire des siècles (Fernandes, 2021 ; Nascimento, 2021).

    Le “métier de rêve”, vivre du travail créatif à partir de l’art et de la culture, est une utopie réalisable, ainsi qu’un indice du malaise de la classe travailleuse à la fois avec le monde du travail du capitalisme contemporain et avec la psychopolitique néolibérale basée sur la performance, la compétitivité, l’individualisme et le consumérisme (Han, 2020).

    Dans ce dossier, nous avons l’intention de rassembler des articles qui analysent les périphéries urbaines à partir de leur production artistique et culturelle. Comme la périphérie/la banlieue n’est pas seulement un espace géographique, mais surtout un lieu symbolique, nous comprenons cette production culturelle de manière large, partant des périphéries urbaines comme référence créative. Cette perspective inclut les différentes formes culturelles, comme le funk, le hip hop, le graffiti, le carnaval, ainsi que le théâtre, la danse, le rock, les arts visuels et audiovisuels, la littérature, les festivités populaires, etc.

    Toujours dans cette compréhension de la périphérie comme lieu symbolique, nous ne limitons pas notre approche à la production culturelle des favélas et des quartiers populaires. Les quilombos urbains, les indigènes vivant en ville, les hôpitaux psychiatriques, les centres de soins psychosociaux (CAPS), les écoles et les universités publiques, les prisons et les centres socio-éducatifs sont des lieux où l’art et la culture sont présents, comme tactiques de survie et comme stratégies d’espoir. Nous cherchons à comprendre les confluences possibles entre ces différentes conditions périphériques (SANTOS, 2023).

    Cette périphérie, symbole d’une expérience partagée par la classe ouvrière urbaine, crée un langage en partie universel. Ce langage se crée et se manifeste dans les multiples créations présentes sur ces territoires. L’un de ces points communs est le fait que ces artistes voient la culture comme un travail, comme un moyen de garantir leur subsistance, la production et la reproduction matérielle de la vie. À l’heure de la précarité généralisée dans le monde du travail, le rêve de vivre d’un métier de l’art et de la culture devient encore plus frappant. La précarité augmente la souffrance physique et mentale des travailleurs. Mais elle rapproche aussi les conditions ordinaires de rémunération et d’emploi de l’incertitude typique du travail artistique. Si jusque dans les années 1990, le dilemme de l’artiste populaire était celui de devoir choisir entre l’emploi formel et l’absence de garanties de travailler avec l’art, aujourd’hui les alternatives au travail artistique n’offrent plus de sécurité. Cette situation a été étudiée au Brésil (Facina et al., 2019), mais nous sommes intéressés à créer des ponts et des parallèles avec d’autres périphéries urbaines du monde, qui partagent les valeurs et les reconnaissances communes à travers la mondialisation économique et culturelle, mais admettent également des particularités locales, que ce soit en Amérique latine, en Amérique du Nord, en Europe, en Asie ou en Afrique.

    En effet, nous pouvons observer, en tant que chercheurs ou intéressés, qu’il existe une créativité immense et foisonnante dans les périphéries urbaines du monde. Il n’est pas possible de penser les villes, au centre et à la périphérie du capitalisme, sans analyser cette effervescence. Ce sont des formes des « cultures d’en bas » qui s’imposent aux cultures dominantes ou hégémoniques (Capanema et al., 2020 ; Liguori et al., 2022). Elles apportent de précieuses constributions à des possibilités utopiques, à des nouveautés viables, comme le disait Paulo Freire (2011), qui nous permettent d’affronter l’apocalypse et de repousser la fin du monde (Krenak, 2019), tout comme de réfléchir aux dilemmes et aux impasses du monde actuel et à venir (crise climatique, crise de l’information, négationnisme, nouvelles formes de fascisme, fracture sociale) (Fassin,  2022). Les études sur les dynamiques créatives dans les périphéries – espaces de résistance, de survie et d’innovation constante – peuvent soutenir et renforcer les politiques publiques qui dialoguent avec cette production.

    Dans ce dossier, nous cherchons à rassembler des travaux qui contribuent à l’élargissement des horizons de reflexion pour la problématisation théorico-méthodologique de la production culturelle sur les périphéries urbaines, en s’appuyant sur des données empiriques issues des recherches de terrain ou d’archives. Nous cherchons à rassembler des articles, des études bibliographiques ou des essais audiovisuels qui traitent d’expériences ethnographiques de terrain, problématisent des questions de méthodologie ou analysent les innovations théoriques qui abordent la complexité du thème.

    Pour les règles générales relatives à la soumission et à la traduction d’articles, voir: https://www.scielo.br/journal/vb/about/#instructions.

    Dates importantes:

    Publicité de l’appel et soumission des articles:
    Novembre/2024- mai/2025
    Attribution et finalisation des examens:
    Juin – Septembre/2025
    Ajustements et livraison des versions finales des articles:
    Octobre – Novembre/2025
    Livraison des textes:
    Décembre/2025
    Révision
    Janvier et février/2026
    Publication du dossier:
    Mars/2026

    Call for papers
    “Periphery is Periphery anywhere”: cultural production in urban peripheries

    The verse that gives this dossier its title was taken from the song ‘Brasília Periferia’, composed by Gog, a pioneering rapper and reference for the hip hop movement in Brazil, and released in 1994 on the album Dia a Dia da Periferia. This phrase became a common saying in the Brazilian peripheries, especially after it was quoted by the Racionais MC’s in the song ‘Periferia é Periferia’, which appears on the Sobrevivendo no Inferno album, from 1997. For us, this phrase points not to a standardisation of differences, in the sense that the periphery is all the same. Rather, it points towards the identification of a global phenomenon, the result of the dynamics of the capitalist mode of production, which creates peripheries even in the centre of capitalism, which reproduces itself through the over-exploitation and precariousness of the working class around the world. There is a common experience in the formation of peripheral subjects (D’Andrea, 2022).

    Researching urban peripheries is not about following some kind of colonialist desire for the exotic, for the collection of strange and surprising practices produced by the Other. Urban peripheries are the centre of capitalist development today, where contemporary dystopias and utopias are concentrated. Understanding the contemporary world, its contradictions, dangers and possibilities for the future requires close observation of what is happening in the urban peripheries, particularly (but not only) those of the global south.

    Philosopher Paulo Arantes (2023) argues that a Brazilianisation of the world is underway, an irony that reverses the positive meaning of the myth that Brazil is the country of the future. Brazil’s obscene social inequality, the enclosure of the upper classes in elite ghettos, the trivialisation of the extermination of the poorest, especially blacks and indigenous people, the lack of access to basic rights, the precariousness of social and labour rights, the dismantling of public social assistance institutions, the brutal financialisation of the economy, the association between citizenship and consumption, the slumification of cities, the predominance of informal work, violent and militarised social control, racism and xenophobia that stigmatise the populations of working class neighbourhoods in different parts of the world, ultra-individualistic banditry, the growth of church-companies capable of spreading the spirit of neoliberalism and a violent conservatism that turns against minorities and takes the form of a holy war of Good against Evil are some of the characteristics that are advancing from the peripheries to the centre of global capitalism. The malaise in the city is a reflection of a social breakdown that stems from the current stage of the capitalist mode of production.

    Following the same line of argument, geographer Thiago Canettieri (2020) states that with the decomposition of the labour society, a new social configuration has emerged based on the periphery form. A condition marked by violence, precariousness, subject to intense regimes of exploitation and the total subsumption of life, integrated by exclusion, distinctive features of social forms that have always been present in the peripheries of peripheral countries. With the unfolding of the crisis of capital and the collapse of modernisation, we can see the becoming-periphery of the world. The periphery-form is therefore the way in which a society in collapse is managed. The universalisation of the periphery-form is the becoming-periphery of the world.

    Social domination through precariousness has an impact on the formation of subjectivities, discouraging class solidarity and feeding diffuse social fears and resentments, which are available for capture by hate speech, conspiracy theories and scientific denialism. On the other hand, forms of gentrification of peripheral territories appear ambiguously as a unique response to neoliberal capitalism, but also as a threat of expulsion and loss of references for populations already rooted in a peripheral territory, especially the most impoverished and discriminated against.

    These reflections are fundamental to understanding the historical moment in which we live. However, they lack what Didi-Huberman (2011) called the survival of the fireflies. In this pre-apocalyptic scenario, where are the little lights, the glimmers that allow us to glimpse ways out, to imagine alternative futures that will animate the social struggle and combat the conformism that results from absolute pessimism?

    Researching the art and culture produced in urban peripheries is a way of looking for those fireflies, those fragile lights that subtly illuminate the night, capable of showing that the contradictions of the capitalist mode of production always leave gaps for its replacement by a fairer and happier way of life. As Fredric Jameson (2021) says, it’s easier to imagine the end of the world than the end of capitalism. The utopian imagination is at a low level in our times.

    The dream of making a living from working with art and culture is present in the urban peripheries.  In Brazil, this dream job hardly ever becomes a means of living for the working class and is opposed to the precarious occupations available to this class, whose time is always stolen by overexploitation and the fragility of labour rights. According to the Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE), 38.7% of the Brazilian working class is in informal jobs, which means without any protection of labour rights. Among black people, this percentage exceeds 40 per cent. The number of informal workers (38.9 million) is higher than the number of formal workers (38 million). In the countries of the global North, although the relationship between formal and informal work is not the same, the peripheries also have a higher unemployment and poverty rate, and some working class neighbourhoods are areas where there is a significant presence of post-colonial migration, to the point where the debate on the issue seen solely as a ‘social’ issue is also a ‘racial’ issue in Europe (Fassin & Fassin, 2006). In this sense, the peripheries of the central countries of capitalism are also close to the peripheries of the peripheral countries, where poverty and racial discrimination coexist (Fernandes, 2021; Nascimento, 2021).

    The dreamed work, living from creative work with art and culture, is an achievable utopia and an index of the working class’s unease with both the world of work in contemporary capitalism and neoliberal psychopolitics based on performance, competitiveness, individualism and consumerism (Han, 2020).

    In this dossier we intend to bring together articles that analyse the urban peripheries from the point of view of their artistic and cultural production. As the periphery is not just a geographical space, but above all a symbolic place, we understand this cultural production in a broad way, taking the urban peripheries as a creative reference. This includes funk, hip hop, graffiti, carnival, as well as theatre, dance, rock, visual and audiovisual arts, literature, popular festivals, etc.

    Still with this understanding of the periphery as a symbolic place, we are not limiting our approach to the cultural production of the favelas and working class neighbourhoods. Urban quilombos, indigenous people living in the city, psychiatric hospitals, Psychosocial Care Centres (CAPS), public schools and universities, prisons and socio-education centres are all places where art and culture are present, both as survival tactics and as strategies of hope. We seek to understand the possible confluences between different peripheral conditions (SANTOS, 2023).

    This periphery, symbolising an experience shared by the urban working class, creates a language that is partly universal. This language is created and manifested in the multiple creativities present in these territories. One of these commonalities is the fact that these artists see culture as work, as a way of guaranteeing a livelihood, the material production and reproduction of life. In times of generalised precariousness in the world of work, the dream of making a living from art and culture becomes even stronger. Precarisation increases the physical and mental suffering of workers. But it also brings ordinary pay and employment conditions closer to the uncertainty typical of artistic work. If, until the 1990s, the popular artist’s dilemma was to choose between a salaried job and the lack of guarantees of working with art, nowadays the alternatives to artistic work no longer provide any security. This situation has been studied in Brazil (Facina et al., 2019), but we are interested in creating bridges and parallels with other peripheries of the world, which share common values and recognitions through economic and cultural globalisation, but also admit local particularities, whether in Latin America, North America, Europe, Asia or Africa.

    The fact is that we can observe, as researchers or interested laypeople, that there is an immense and teeming creativity in the world’s urban peripheries. It is impossible to think of cities, in the centre and on the periphery of capitalism, without analysing this effervescence as forms of ‘cultures from below’ that impose themselves on dominant or hegemonic cultures (Capanema et al., 2020 ; Liguori et al., 2022). It provides precious hints of utopian possibilities, of viable novelties, as Paulo Freire (2011) used to say, that allow us to confront the apocalypse and postpone the end of the world (Krenak, 2019), as well as reflect on the dilemmas and impasses of the current and future world (climate crisis, information crisis, negationism, new forms of fascism, social fracture) (Fassin, 2022). Studies on the creative dynamics of the peripheries – spaces of resistance, survival and constant innovation – can support and strengthen public policies that dialogue with this production.

    In this dossier, we seek to bring together works that contribute to broadening reflexive horizons in the theoretical-methodological problematisation of cultural production in urban peripheries, based on empirical data from field research or archives. We are looking to compile articles, bibliographical reviews or audiovisual essays that deal with ethnographic fieldwork experiences, problematise questions of method or refer to theoretical innovations that deal with the complexity of the subject.

    For general rules on submitting and translating articles, see: https://www.scielo.br/journal/vb/about/#instructions

    Important dates:

    Publication of the call and Submission of articles:
    November/2024- May/2025
    Assignment and finalization of reviews:
    June – September/2025
    Adjustments and delive y of the final versions of the articles:
    October – November/2025
    Delivery of texts:
    December/2025
    Editing
    January and February/2026
    Publication of the dossier:
    March/2026

    Referências bibliográficas:

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